Fidelíssima Fênix


Foto: arquivo do site da Prefeitura de Sobral

Nota: neste poema há um trecho (destacado por aspas) 
da letra da música "Porto" de Laerte Melo


abro as cancelas ao norte

feito um deus tropeiro voador

como uma asa-branca fantástica 

ou pavão misterioso de asas douradas


pairo sobre as carnaubeiras e oiticicais

para pousar sobre as caiçaras das ribeiras

num stop over mútuo de luz e escuridão


o gondoleiro já foi loiceiro 

a chapeleira foi lavadeira 

tribos por aqui se mataram

faquistas já se embolaram

preto e pobre não tinham nada,

tinham apenas sua fé, seus terreiros e festas

os ricos, seus palácios, suas fazendas

suas praças e cemitérios


mas estas minhas asas imensas

me fazem decolar do passado

empoeirado de coronéis 

para uma layover no presente 


sobrevoando os edifícios

em avenidas asfaltadas

vejo bairros e condomínios

sobre os riachos aterrados

becos que foram veredas

escolas que eram fábricas

agora estações são galerias

e os palácios são para todos


substituo minhas asas por pequenas hélices

e me deixo levar por uma placa lógica

para um último rasante


passo por arcos e anéis

cruzando pontes, trilhos e rios

sobrevoando escadarias, morros e templos

e depois de me queimar ao dia

vou reviver na noite

nos palcos, nas calçadas, nos bares

nesse pequeno mapa do mundo

qual fênix disfarçada de garça

transmutada de ema

dançando aos acordes de um trovador imortal

nos “caminhos dispersos na vida

tão dispersos que eu não posso ver

a distância dos filhos perdidos

esquecidos, ausentes da gente”

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