Pouso




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estou  à  mesa do seu café
porque sou o sabor amargo
da cafeína que me torna grande
que me faz produzir versos
com a chuva
essa chuva que assusta
densa de solidão
carregada de amores evaporados

não me chame de outro
não me encaixe em esquemas fáceis
não me leia rápido
não me tema
estou nas nuances
no meu "oi" lacônico
ecoado no mapa dos acontecimentos
se minha voz interpela
meu ser profundo arde
se meu silêncio é resposta
não há mais perguntas para a fé
não há mais questões para a esperança
há apenas respostas covardemente lançadas

estou bem perto
sou sólido
sou este cheiro do medo
de ficar  só
de me tornar insípido
nas redes virtuais
medo de não ser lido
em tempo necessário
antes de impedirem a vinda do logos
medo da partícula pandêmica
instalada no caos
que todo dia me arremessa ao acaso
em direção ao útero cósmico
como tudo talvez o fora criado
desde o princípio

estou a sua frente
temível
mas aberto
longe da sua inteligibilidade
eu me recrio no seu toque
e no franzir da sua testa
rio da sua piada mal feita
dos seus erros ortográficos
dos seus textos compartilhados
mas me faço caminhante do tempo
e assunto seu olhar para as estrelas
porque eu sou muito do seu silêncio
e bem pouco dos seus alarmes

e depois de sair da solidão de seu quarto
vou absorver sua alma
desintoxicada do pavor
vou me sentar ao seu lado
na sala, nas praças e nos becos
e rever todas as coisas com seus olhos
e quando minhas asas se abrirem
vou sobrevoar
os seus mundos desconstruídos
pela ilusão
desobstruir o ontológico
e desativar a sintática dos predicados verbais
pois o que era já fora
mas o que seria
ainda será

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