Gritos estilhaçados






entupido de Vygotsky
sento-me à mesa
apático
abro a lista
fecho-me ao hodierno
inicio a chamada
– Conflito ?
– Presente!

e sigo pelos corredores
escuros
sombrios
tateando paredes
arranhando amores
escutando vozes
vozes estranhas
vozes dançantes
transformantes
vozes anormais
vozes que o branco quis calar

alguém grita na rua
alguém se corta no quarto
alguém apanha na sala
alguém socorra alguém

fecho as janelas
fecho meus olhos
confesso credos
confesso o medo
acendo velas
ascendo à solidão
porque não há mais empatia
nem mais a glossolalia

entrego-me à apostasia
entrego-me à afasia

gritam gritam
meus apelidos mil vezes
e pelos corredores amarelos
de minha inexistência amarelecida
penso, logo corro

corro sem rosto
procurando espelhos
mas só vejo tua face
escura
irreflexa
sisuda

corro sem nome
sem número
na tua lista de chamada
corro pelo pátio
pelo jardim
o jardim o jardim
sem a flor do ódio
sem pétalas de preconceito
o jardim do Éden
de Rubens
de Bosch
o jardim de Epicuro

mas quando colher os frutos
dessas flores pálidas?
por enquanto não há frutos
nem flores
porque o tempo chegou

e se liquefaz pelas mãos

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