Diogenes, the Dog. Plaster Suclpture, Late 19th Century [Original at the Villa Albani, Rome |
Ouvi lá fora
bem longe dos meus esquemas intelectuais
um grito
vindo das ruas e dos becos.
E fora das janelas
não havia ninguém
se não fosse apenas um cão guenzo
desfilando sobre o nada.
Mas quando a noite cai
os desejos se levantam...
Ainda se ouvia, trêmulo e sibilado,
ecoando nas vielas
o grito vespertino.
Não era o vento querendo me enlouquecer
nem a visão da meia-noite a me apavorar.
Talvez fosse o tilintar das taças burguesas
ou os alarmes de suas BMW...
Poderia ser os sinos dos templos católicos,
um lamento de carpideiras misteriosas...
Um grito.
Eu e o cão guenzos, solitários, afoitos
a desfilarmos pelos ladrilhos
sem roupa,
sem coleira
num andar sinuoso
na cadência do grito.
A noite se ia...
As janelas permaneciam fechadas
pois não havia mais ninguém para abri-las.
Havia o grito e já era dia
E eu ali, sobre os ladrilhos de uma ladeira
sem coleira,
sem roupa
ia me tornando, aos poucos,
a poesia da criação divina.
Percebi que eu nascera ali
da costela de um cão
da fusão
entre tarde, noite e dia.
Nascera ali
não pelo poder da palavra
mas pelo poder de um grito.
E o que fora criado era bom.
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