Crônica de Fim de Ano



Era fim de ano ocidental. O cronista entendia que precisava delas, das palavras, e resolveu sair pelas ruas de sua cidade. Cumprimentou os desconhecidos. Acenou para os apressados. Agradeceu aos que o amaram. Passou em frente ao local de trabalho, uma escola pública de muros azul-celeste. Circulou pelo espaço cultural da cidade. Genuflectiu no primeiro banco da igreja matriz. Sentiu saudades das enormes estátuas de indígenas que não estavam mais na praça. Nem as estátuas nem os indígenas. Sentiu saudades também dos amigos da cidade de infância. Lembrou-se da irmã que há cinco dias parira a menina Natalie. Atendeu um telefonema de um amigo “gauche” na vida. Parou num bar. Pediu uma cerveja. Enviou uma mensagem pelo celular para outro amigo. No primeiro copo de cerveja sorriu de si mesmo e agradeceu a si mesmo pelo sorriso. O terceiro copo lhe trazia um sabor amaríssimo, pois as pessoas que o decepcionaram lhe vieram à mente. Não eram muitos. Sorriu-se de novo. Agradeceu-se de novo. O quarto copo de cerveja foi prosopopaico. As bolhas lhe sorriam e lhe gritavam. Quimicamente gritavam. As bolhas de cerveja espumavam e gritavam “Feliz Ano Novo!”. Ele sorriu de novo porque as encontrara, as palavras. Ele agradeceu-se pelo sorriso. De novo.

Comentários

  1. Muitos desses sentimos os sentimentos e não sabemos identificá-los ou nominá-los e você os traduziou e os nominou.

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